Com medidas de distanciamento social, hotéis da Região Norte buscam reaquecer setor

Conhecido como Caribe Amazônico, Alter do Chão (PA) tenta recuperar perdas no setor turístico (Reprodução/Internet)

01 de julho de 2020

19:07

Thiago Fernando

MANAUS – Mesmo de maneira tímida, setores como o de hotelaria já sentem um aumento na procura para o segundo semestre de 2020. Visando diminuir os prejuízos acumulados desde o início do ano, empresários da Região Norte implementam medidas para vencerem os fantasmas deixados pela Covid-19.

De acordo com a empresária Eliana Barreto de Paula, proprietária da Pousada Sombra do Cajueiro, localizada em Alter do Chão, distrito de Santarém (PA), as pousadas e hotéis da região – conhecida como Caribe Amazônico – estão se readequando para atenderem as medidas de segurança implementada no último mês pelo Ministério do Turismo (MTur).

A Pousada Sombra do Cajueiro diminuiu o número de mesas para evitar aglomeração durante as refeições (Divulgação)

Antes da pandemia, a economia brasileira projetava grandes expectativas para 2020. Entretanto esses e muitos outros planos foram cancelados devido à pandemia da Covid-19. Agora, após a reabertura do comércio em grande parte dos Estados, os brasileiros buscam se adaptar ao novo ‘normal’, para retomar suas atividades.

“A procura ainda é tímida. Recebemos ligações e emails de pessoas procurando informações sobra a pousada para setembro. Vamos fazer tudo para que as pessoas se sintam acolhidas e seguras nas dependências. Vamos colocar vários dispenser de álcool in gel pelo hotel. Além disso, vamos trocar as toalhas de rosto por toalhas descartáveis. O check e o pagamento serão online. Vamos respeitar o distanciamento nas áreas comuns. O café será servido individualmente. Não será mais estilo buffet”, informou a empresária.

Abatidos em plena decolagem

Localizado em uma das mais charmosas ruas de Manaus, a 10 de Julho, o Juma Ópera teve que fechar às portas temporariamente menos de dois meses após sua inauguração por causa da pandemia da Covid-19. Para o gerente geral do hotel, Rodrigo Dezan, o time não poderia ter sido pior.

“Fomos abatidos em pela decolagem. Inauguramos em fevereiro e tivemos que fechar tudo em março. Cancelamos as reservas e mandamos os funcionários para casa. Ficamos apenas com a segurança e a equipe de manutenção. Esperávamos um ano muito bom, mas 2020 já acabou”, afirmou o administrador.

Após a reabertura do comércio, o hotel voltou a funcionar com força total. Medidas foram implementadas, tanto para garantir o conforto e segurança dos hospedes como dos próprios funcionários do local. Apesar disso, Dezan informou que a previsão até o final do ano é de prejuízos e que as entradas dos próximos meses servirão apenas para amortizar os custos de funcionamento do Juma.

“Tivemos que abrir, mas as previsões não são boas. Estamos com uma média de dois hospedes por dia, sendo que temos 41 quartos. Nosso restaurante está funcionando normalmente. Apesar disso, sabemos que o nosso planejamento foi comprometido. O Amazonas recebe turistas estrangeiros e de negócios, e os dois estão parados. Não temos um cenário politico bom no nosso País e isso também complica uma possível retomada”, analisou o gerente.

Dezan ressaltou a imagem negativa do Estado durante a pandemia como principal adversário do setor nos próximos meses.

“As imagens das covas abertas com máquinas durante à pandemia circularam o mundo. A instalação de caminhões frigoríficos nas portas dos hospitais para armazenarem os corpos também virou manchete em vários países. Esse marketing negativo reflete diretamente na economia do Amazonas. As pessoas estão com medo de visitarem o Estado”, finalizou.

Comparações

Em abril a Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (Braztoa) divulgou que o faturamento das empresas do setor aumentou 1,4% em 2019, e somou R$ 15,1 bilhões. Segundo Eliana, esse crescimento do setor foi bastante sentido pelos empresários de Alter do Chão, que tinha uma expectativa alta para 2020.

“O ano de 2019 foi bem próspero. Nosso movimento crescente foi muito bom. Ficamos com a lotação completa do dia 1 de julho até o dia 31 de janeiro. Tivemos muitos incentivos culturais que impulsionaram os eventos musicais e gastronômicos. Alter do Chão já tinha se tornado um dos principais destino dos turistas brasileiros. Agora, não sabemos como será a alta temporada, que inicia em julho. Mas a procura está bem menor devido o cenário em que vivemos”, disse a empresária, que acredita no aumento do turismo interno no Brasil nos próximos dois anos.

Investimento no turismo interno

Porta de entrada do Parque Nacional de Anavilhanas, o município de Novo Airão (a 115 quilômetros a noroeste de Manaus) foi abençoado por Deus com diversas belezas naturais como a Cachoeira do São Domingo e Grutas do Madadá. Além disso, passeios pelas ruínas do Velho Airão e nadar com botos cor de rosa são atrações indispensáveis para os turistas.

O espaço comum do local funciona das 9h às 17h30, todos os dias da semana (Divulgação)

É apostando no ecoturismo local que a Pousada Cirandeira Bela Amazon Cabins Spa vem reconquistando o público, em meio à pandemia do novo Coronavírus. De acordo com o sócio proprietário Froylan Filho, procura tem sido grande, sendo que mais de 95% são turistas no Amazonas.

O complexo Cirandeira Bela fica localizado na estrada de Novo Airão 352, Km 10 (Divulgação)

“Estamos seguindo as recomendações da OMS e vamos fazer o possível para não aglomerar pessoas nos espaços sociais. Além disso, contratamos uma empresa especializada em limpeza de hospital e hotéis. Estamos funcionando apenas por reservas, justamente para controlar o número de pessoas. A procura está sendo grande. Percebemos que o nosso publico é fiel. Os moradores da região estão explorando mais o Amazonas”, revelou Froylan.

Segundo estudo divulgado pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), no ano passado, o turismo brasileiro criou 35.692 novos postos de trabalho, uma alta de 1,2% em relação ao total de empregados do setor em 2018.

Representantes do setor esperam lenta recuperação

Em junho, a Rede Brasileira de Observatórios de Turismo (RBOT) em parceria com o Observatório de Turismo (Obstur/PR) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) produziu um estudo após ouvir cerca de 5 mil empresários do setor sobre os impactos da Covid-19 no Brasil. De acordo com os dados coletados, os profissionais acreditam que a recuperação financeira só deve ocorrer em 2021.

Trazendo para o Norte, a expectativa é bem pior. Apesar de alguns empresários relatarem uma tímida retomada, representantes da hotelaria dos estados mais populosos da região afirmam que os prejuízos causados pela Covid-19 serão sentindo durante os próximos três anos.

De acordo com o gerente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Estado de Rondônia (Sindhotel/RO), Francisco Neto, o ano de 2020 já acabou para o setor e a pandemia afeta o planejamento do ano que vem, principalmente pela incerteza em torno de um real controle da doença no Brasil.

“Tínhamos uma previsão muito boa para 2020, principalmente porque Porto Velho seria sede do Fórum Internacional Amazônia + 21, mas tudo foi cancelado em março. Todos os eventos foram cancelados no estado. Assim, para a hotelaria, 2020 já morreu. Estamos há três meses fechados e não sabemos quando vamos conseguir reabrir”, salientou Neto

Caiu cerca de 90% a movimentação no Mercado Cultural de Porto Velho (RO) após o início da pandemia de Covid-19 (Divulgação/Internet)

No último dia 29, o prefeito de Porto Velho (RO), Hildon Chaves (PSDB) defendeu a instauração do lockdown. A medida, segundo o representante da Sindhotel/RO, causa ainda mais incerteza no setor, visto que a reabertura do comércio já havia sido anunciada pelo governador Coronel Marcos Rocha (PSL).

“Nem no mercado interno está circulando dinheiro. Estávamos no segundo ciclo de reabertura do comércio na capital, mas voltamos para o primeiro após um novo pico de casos confirmados. No interior, estão na segunda fase. Assim, as pessoas não estão saindo de casa. As viagens estão limitadas. Não tem previsão nenhuma. Em Porto Velho, os hotéis estão com 30% da capacidade. Mas temos cidades vizinhas que estão quase zeradas. Todos estão no prejuízo”, completou.

No segundo maior estado do Norte, a hotelaria deve passar por uma reestruturação no pós-pandemia. O presidente do SindHotéis/AM), Paulo Rogério Tadros, afirmou que alguns empresários terão que fechar as portas no Amazonas.  

“Não adianta pensar que vai ser como era antes da pandemia, até porque, não tem como sobreviver a seis meses sem movimento, apenas com despesas e sem esperança. Hoje, praticamente todos estão fechados. Apenas os flats estão abertos e com menos da metade da capacidade. Já tem empresários que não vão voltar, porque não justifica mais o negócio pelo tempo de recuperação”, revelou.

O hotel Juma Ópera enfrenta a baixa procura no primeiro semestre de 2020 (Mari Campos/Divulgação)

Um dos fatores mais complicados para Tadros nessa retomada será lidar com a imagem negativa transmitida para Estado ao mundo, principalmente com a veiculação dos sepultamentos coletivos realizados em Manaus. O empresário frisou que a insegurança já reflete na economia local.