Em Manaus, Conselho de Educação suspende resolução que inclui temas de diversidade religiosa e de gênero no ensino infantil

O prazo é de 90 dias com possibilidade de prorrogação (Reprodução/ Márcio James/Semcom)

17 de março de 2021

21:03

Priscilla Peixoto

MANAUS- O Diário Oficial do Município publicou, nessa terça-feira, 16, a resolução nº 054 do Conselho Municipal de Educação de Manaus, aprovada no último dia 25 de fevereiro, onde suspendeu os efeitos da resolução nº 091 a qual se propunha a inclusão da Educação para as Relações Étnico-Raciais, diversidade sexual e gênero, bem como diversidade religiosa, no sistema de ensino municipal de Manaus.

De acordo com informações do presidente do Conselho Municipal de Educação (CME), Thiago Lima e Silva, o pedido foi encaminhado ao conselho pelo vereador Raiff Matos (Democracia Cristã). A suspensão, segundo Thiago Lima, também foi uma iniciativa necessária para o aprimoramento de como tais temas serão abordados nas salas de aulas.

“O colegiado entendeu que, como a temática é muito polêmica, o caminho mais acertado é promover audiências públicas, para no processo de escuta aperfeiçoar a norma”, disse o presidente. Ainda de acordo com o presidente do CME, após a ampla discussão envolvendo órgãos do Sistema Municipal de Ensino (SME), a norma será novamente revista com as contribuições advindas das audiências.

Período e ponderação

O prazo é de 90 dias com possibilidade de prorrogação, mas Thiago Lima acredita que em uma perspectiva mais realista, o estudo sobre as questões mencionadas só será uma realidade em sala de aula no ano de 2022. No início deste ano, profissionais de educação até chegaram a comemorar a possível inclusão de estudos sobre racismo, homofobia e a discriminação no currículo escolar dos ensinos infantil e fundamental, aprovada pelo Conselho Municipal de Educação (CME).

Para o pedagogo e mestre em educação Abel Santos, 43 anos, a decisão não surpreende, porém, a classificou como decepcionante. De acordo com o mestre educacional, falta mais conhecimento sobre decisão e os temas em questão.

O estudo sobre as questões mencionadas só será uma realidade em sala de aula no ano de 2022 (Reprodução/Semcom)

“Eles acham que abordar sobre sexualidade, educação sexual é ensinar sobre ato sexual e não é isso. Por que eles não pegam a resolução do que já foi aprovado antes e vão estudar e sem fazer suspensão realizam um debate do que já foi debatido e tem sido trabalhado há tanto tempo?”, questionou o professor.  

A REVISTA CENARIUM, inclusive, levou a indagação feita pelo pedagogo ao presidente do CME, que alegou que sem a suspensão, a implementação talvez não feita da maneira correta. “Caso isso aconteça fica mais difícil de corrigir possíveis distorções”, explicou o presidente.

O pedagogo fez questão de pontuar sobre as igrejas e posicionamentos religiosos que interferem no processo. “Eu reconheço que há uma ignorância muito grande dentro destes setores que acabam atrapalhando e não separando o que é estado laico daquilo que é pessoal, subjetivo como a fé. Não me surpreende até porque temos um prefeito que tem uma posição confessional e isso tudo tem todo um lobby muito forte em torno das igrejas evangélicas que infelizmente que tem alguns líderes que desconhecem como funciona o processo dentro do sistema educacional”, lamenta o mestre.

Asprom Sindical

O coordenador de Comunicação do Sindicato dos Professores e Pedagogos de Manaus- (Asprom Sindical), Lambert Melo, também comentou sobre a resolução e também não aprovou a medida.

“Essa resolução foi bastante comemorada pelos progressistas da sociedade civil organizada, pois ela significava um grande avanço dentro do currículo da escola pública no sentido de incentivar a tolerância entre os indivíduos e a aprendizagem e respeito ao ‘diferente’ e infelizmente a partir dessa atual decisão vejo, por hora, um retrocesso”, comenta o coordenador.

Apesar de lamentar, Lambert afirma que entende a boa vontade da CME em relação aos debates a respeito da temática. Porém declara que os debates precisam ser feitos por meio de audiências públicas e de forma mais ampla envolvendo a sociedade que tem interesse na decisão.

Ele afirmou ainda que a resolução que garante a inclusão dos estudos das que envolvem intolerância religiosa, étnicos-raciais, gêneros e sexualidade têm que ser garantidas, uma vez que proporciona a manutenção da cultura e o combate à ideologia do ódio que tem sido tão presente nos tempos atuais, segundo Lambert.

O que diz o vereador?

Em resposta à REVISTA CENARIUM, o vereador que fez o pedido de suspensão ao Conselho Municipal de Educação, que informou:

“Encaminhei pedido de informações sobre a resolução nº 091 do CNE, aprovada no dia 29 de dezembro, mas publicada no DOM no dia 13 de janeiro. Sou contrário aos termos da resolução, do jeito que foi aprovado, por considerar o assunto delicado para ser transmitido aos estudantes sem um trabalho prévio de qualificação das escolas. A comunidade não pode ficar de fora no debate sobre a inclusão ou não desse tema. Os pais precisam ter direito de opinar sobre a formação de seus filhos, principalmente a partir de temas transversais”, declara Raiff Matos.

E continua a declaração com as seguintes indagações: “De que forma isso será passado? Serão incluídas todas as visões sobre essa questão respeitando as individualidades? Hoje há claramente um embate ideológico sobre questões de gênero, o que exige um cuidado e um preparo prévio que a resolução não indica, quando fala da inclusão da temática nas escolas públicas”, informou a vereador.