Desigualdade racial: mulheres negras têm piores indicadores de acesso ao pré-natal no Brasil

O texto mostra que, em média, houve 8 mortes maternas a mais de mulheres negras que de mulheres brancas para cada 100 mil nascidos vivos (Reprodução/Internet)

09 de setembro de 2022

18:09

Priscilla Peixoto – Da Agência Amazônia

MANAUS – No Brasil, mulheres negras têm piores indicadores de acesso ao pré-natal, bem como maiores taxas de mortalidade materna durante a gestação, o parto e o puerpério, é o que aponta o relatório “Desigualdades raciais na saúde: cuidados pré-natais e mortalidade materna no Brasil, 2014-2020″, formulado pelo Instituto de Estudos para Política de Saúde (IEPS).

O estudo focado no período de 2014 a 2020 mostra que, em média, houve 8 mortes maternas a mais de mulheres negras do que de mulheres brancas para cada 100 mil nascidos vivos. “Ao analisar a evolução da porcentagem de pré-natais adequados, segundo raça/cor, verificou-se que existem diferenças persistentes entre mulheres negras e brancas durante o período analisado (2014 a 2020)”, consta um trecho do documento.

Violação à vida

Na leitura da pesquisadora, ativista social e coordenadora de Formação Política do Instituto Nacional Afro Origem, Izete Santos, o diferencial racial apontado no acesso aos serviços de atenção à saúde materna mostra, em resumo, a violação do direito à vida desde o período gestacional.

“Ao nos depararmos com um relatório como este, percebemos a violação de um direito que diz respeito à vida. Estão sendo violadas as normas de proteção do direito à vida, à saúde e à dignidade que a Constituição tanto fala. Uma realidade que coloca em risco mulheres e, consequentemente, seus filhos “, afirma Izete que complementa:

Gráfico do relatório do Instituto de Estudos para Política de Saúde (IEPS) (Reprodução/Divulgação)

“A saúde e a vida do feto depende da saúde da vida da mãe e saindo da Constituição, partindo para o Estatuto da Criança, no qual o artigo 7, que também fala dos direitos fundamentais à vida e à saúde, notamos que a criança e o adolescente têm direito à proteção, à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso em condições dignas de existência“, ressalta a pesquisadora.

Dados

Conforme o estudo, no ano de 2014, enquanto 76,1% das mulheres brancas realizaram um número adequado de consultas pré-natais, apenas 59,8% das mulheres negras acessaram esses cuidados. Desse período até 2019, o levantamento constatou uma gradual melhora, com assistência adequada de 81,2% das mulheres brancas e 67,8% das mulheres negras. 

Segundo o documento, em 2020, com o período pandêmico, a proporção de gestações de nascidos vivos com o número de consultas de pré-natal adequado caiu 0,54% para mulheres brancas, enquanto para mulheres negras cai 1,44%.

“Em 2020, com o primeiro ano da pandemia da Covid-19, nota-se, então, uma reversão da tendência do período de 2014 a 2019, regredindo a diferença mais de mulheres negras que de brancas”, destaca o relatório.

Nuances do racismo

A coordenadora do Instituto Nacional Afro Origem cita as nuances do racismo, refletindo na diferença de tratamento e atendimento para com a mulheres negras que são preteridas, em relação à mãe não negras.

“Aí, nós voltamos à política que o sistema de saúde tem, por meio do governo federal, que é garantir o atendimento ético, humanizado e de qualidade a todos os usuários, e essa premissa da própria política voltada à saúde da população negra já apresenta um problema, pois, aparenta que os profissionais de saúde que ali estão para acolher a mulher no pré-natal excetuam e preterem as mães negras, logo, a política de saúde integral da população negra também está sendo violada“.

Trecho do relatório do Instituto de Estudos para Política de Saúde (IEPS) (Reprodução/Divulgação)

A estudiosa das questões voltadas para a população negra no Brasil ressalta o racismo institucional e o racismo estrutural efetivado e reforçado ao conceder tratamento que difere as mulheres negras e não negras.

Racismo institucional, pois é algo que ocorre dentro de uma instituição pública, e o racismo estrutural reforçado por um tratamento que insiste em manter as pessoas negras desse País em posição de subalternidade e inferioridade”, explica.

Sobre a pesquisa

O estudo Desigualdades raciais na saúde: cuidados pré-natais e mortalidade materna no Brasil, 2014-2020″ foi formulado a partir da utilização de dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc) e do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde do Brasil (DataSUS).

Eles são referentes ao período entre 2014 e 2020, para o qual foi possível calcular os indicadores de assistência ao pré-natal adequado e à Razão de Mortalidade Materna (RMM). Para o recorte racial, o documento segue a classificação oficial do IBGE (Petruccelli & Saboia 2013), utilizando tanto a categoria negra, que é a agregação das categorias preta e parda.

Quanto essas últimas desagregadas, seguindo recomendações de especialistas da área (Santos et al. 2022), a fim de explicitar a complexidade e nuances do fenômeno – uma vez que a raça é, sobretudo, sob o ponto de vista sociológico, um elemento essencialmente político”, informa o texto.

Leia a pesquisa na íntegra: