Dia de Yemanjá, Rainha das Águas e protetora dos navegantes, é comemorado nesta terça-feira

Yemanjá é retratada em diversas formas e é conhecida como Rainha das Águas (Reprodução/ Internet)

02 de fevereiro de 2021

13:02

Priscilla Peixoto

MANAUS – “Ela mora no mar, ela brinca na areia, no balanço das ondas a paz ela semeia”, com essa canção de Marisa Monte em homenagem à rainha das águas que destacamos que nesta terça-feira, 2, é celebrado o Dia de Yemanjá, umas das divindades mais conhecidas do Brasil. Amada e querida por muitos, a divindade afro-brasileira é festejada com muita alegria e devoção em diferentes estados do País.

A CENARIUM conversou com devotos e representantes de matrizes africanas para conhecer um pouco mais sobre a data e a orixá considerada a Rainha das Águas, padroeira e protetora dos navegantes e pescadores.

Segundo o coordenador-geral da Articulação Amazônica dos Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana (Aratrama), Alberto Jorge, ao pé da letra, o nome Yemanjá significa “Mãe dos Peixes”. Filha de Olokun, orixá rei dos oceanos, ela, além da Rainha das Águas, é considerada a mãe de todos os orixás ao lado de Oxalá que é considerado pai.

No Brasil, a tradição de se cultuar Yemanjá, principalmente no eixo nordeste, deve-se às colônias de pescadores que fazem promessas para Nossa Senhora dos Navegantes e Yemanjá, simultaneamente. “Essa tradição se deve ao sincretismo das promessas de levar presentes a elas para ter um ano de boa pesca”, explica Alberto Jorge.

Representação

No Candomblé, ela é um arquétipo de maternidade e amor incondicional, senhora protetora do filho que está em apuros. “Ela vem de um período mais antigo do que podemos imaginar. Para nós, dentro de uma visão antropológica, ela é um ancestral feminino de fertilidade”, diz pai Alberto.

Para uma das dirigentes do Templo de Umbanda Universalista Rosa dos Ventos, (TUURV), Lilian Pantoja, na Umbanda, a figura de Yemanjá traz consigo a representação da força da água, o sagrado feminino, dualidade e geração de vida e novos ciclos em todos os aspectos da vida.

“Ela é geradora de novas energias, ela tem como campo de vibração o mar, que depura, que decanta e transforma. Está ligada aos movimentos e transformações internas e nos faz lembrar que somos almas em evolução dentro desse grande oceano da vida e que a gente precisa navegar dentro de um equilíbrio, para que nosso barco não afunde e nem seja danificado pelo nosso egoísmo e crenças limitantes”, explana Lilian.

Figura e ascensão popular

Não há como descartar o fato de que grandes autores e compositores contribuíram para popularizar a divindade no Brasil. As diversas literaturas de Jorge Amado e as canções de Dorival Caymmi disseminaram a figura de Yemanjá em seus contextos folclóricos, religiosos e sacramentais.

No Candomblé, Yemanja é retratada como sereia (Divulgação)

“Quando Dorival diz que é doce morrer no mar nos braços de Yemanjá, quando Elis Regina canta sobre ela, isso se torna, automaticamente, popular e faz com que muitos tomem conhecimento sobre a grande mãe Yemanjá”, completa pai Alberto.

Na Umbanda, diferente do Candomblé, que tem tradicionalmente a imagem de divindade metade mulher, metade seria, a figura da mulher branca, cabelos longos, vestido azul claro andando sobre as águas também foi outro fator para popularização e assimilação pela massa bem como a forte ligação dos pescadores e familiares com a rainha das águas em busca de fartura e proteção para àqueles que vivem das atividades marítimas.

Sincretismo

No sincretismo, Yemanjá é cultuada como Nossa Senhora das Candeias, Nossa Senhora dos Navegantes ou Nossa Senhora da Conceição. Isso acontece por conta do período colonial no Brasil, onde negros tinham como religião o candomblé, porém, em um país onde a religião predominante é o catolicismo, houve uma “associação” da divindade com os santos católicos. Em contextos regionais ela também está ligada à Yara ou Mãe d’água por ser a mãe de todas as águas.

Pai Alberto Jorge (esq.) com membros da igreja católica em Manaus (Divulgação)

O sincretismo não se faz apenas em cima da figura, mas também em função dos símbolos que as imagens trazem ao longo do tempo e da história. “Os negros escravizados foram obrigados a renunciar a sua sacralidade e adotar a religião oficial de seus senhores. Nesse adotar, eles passaram a cultuar Jesus Cristo como Grande Filho de Deus, o que não foi difícil de introduzir e compreender e nesse bojo vem a associação e até mesmo predominância das cores brancos e azul simbolizando os mantos usados por nossa senhora”, esclareceu Alberto Jorge.

Se tratando de sincretismo, segundo Pai Alberto, Manaus possui um dos maiores níveis de aceitação e diálogo inter-religioso do Brasil. “Podemos afirmar, seguramente, e sem medo de errar, que Manaus apresenta maior aceitação e diálogo, eu diria até que em termo de instituição Arquidiocese, Manaus, hoje, estaria no mesmo patamar, senão em um patamar superior ao de Salvador. O diálogo que nós, de matriz africana passamos a ter, se tornou crescente e positivo”, revelou Alberto.

Festa e oferenda

Além do dia 2 de fevereiro, em algumas regiões do Brasil, festa voltada a orixá também é realizada dia 08 de dezembro como é o caso de João Pessoa na Paraíba, onde dia 08 de dezembro também é comemorado o dia de Nossa Senhora de Conceição e para os seguidores da umbanda é dia de celebrar rainha das águas. Já no Rio de Janeiro, ela costuma ser celebrada no dia 31 de Dezembro a passagem de ano com o famoso pulinho das sete ondas acompanhado das oferendas.

Na Bahia, acontece uma das mais famosas celebrações da data, mais precisamente na Praia do Rio Vermelho, em Salvador, onde milhares de devotos se reúnem para pedir, agradecer os desejos alcançados e presentea-la. Já em Manaus, não é tão comum grandes comemorações nesta data. Mesmo com devotos espalhados pela cidade, segundo o Coordenador da (Aratrama) somente os mais contemplativos de origem baiana mantém a tradição de procurar ponta praia ou beira de rio para fazer as oferendas à mãe das águas.

Já mãe Lilian explica que no contexto regional, por falta do mar na região, o que se deve fazer é contactar com a energia de Yemanjá seja onde for. A questão é entrar em conexão, deixar a mente fluir seja na água do mar ou na água do rio.

Para saudar o dia da rainha das águas, é comum os devotos oferecerem flores, doces, perfumes, sabonetes, velas, itens de beleza junto ao desejo de realizações e boas vibrações, mandando embora maus fluídos, energia pesadas e toda tristeza e escassez. É inegável o encanto que brota em meio a fé e a magia de maneira espontânea e pura, seja nas lendas, nas manifestações culturais ou religiosas. Pessoas de diversas origens que se misturam para uma mesma celebração, sem importar classe social ou gênero.

“Acima de tudo é uma data muito especial, seja na praia do Rio Vermelho ou qualquer lugar onde a festa acontece, é impossível não se emocionar e se deixar levar pelo encanto, fé e força que emana por parte das pessoas. Ali não tem rico, pobre ou que tem mais luxo e todos são bem vindos. A natureza recebe todo mundo, você sente Yemenjá na brisa do vento, no balançar das ondas, no frescor da água não importa se é no mar ou nas encontros das águas. O que vale é momento de encontro com suas raízes e ancestralidade”, finalizou Lilian.

Curiosidades sobre Yemanjá

Dia da semana: sábado;
Oferenda: flores brancas e azuis;
Bebidas: doces e suaves;
Animais sagrados: peixe, cabra branca, patas brancas;
Cores: branco cristal, azul claro cristal, verde claro cristal;
Um número: 4
Essência: rosas;
Paramentos e adornos: espelhos adornados, pulseiras, colares, coroas, enfeitados e adornados com conchas marinhas, búzios, estrelas do mar;
O que a aborrece: aborto e estupro (são praticamente imperdoáveis) violência contra tudo que é feminino, poluição do mar, rios e praias.
Outros nomes: Sereia do Mar, Inaé, Aiocá, Marabô, Princesa do Mar, Rainha do Mar, Dandalunda, Janaína, Ísis, Mucunã;