‘É só mais um em um milhão que as mulheres sofrem diariamente’, diz especialista sobre caso de assédio em bicicleta no Paraná

O crime aconteceu durante o dia, diante de vários pedestres em uma avenida (Reprodução/Instagram)

28 de setembro de 2021

21:09

Bruno Pacheco – Cenarium

MANAUS – “Infelizmente, foi muito pior do que eu imaginava! Nós mulheres não temos um minutos de paz!! Saí de casa para andar de bicicleta e volto toda machucada para casa por uma atitude covarde dessas! Todas as medidas cabíveis estão sendo tomadas… Estou bem, só quero que paguem pelo o que fizeram”, declarou a estudante de Direito Andressa Lustoza, que sofreu um acidente de bicicleta nesse domingo, 26, após ser vítima de importunação sexual.

A jovem, de 25 anos, é mais uma vítima da perversidade de aliciadores que tratam mulheres como um “objeto sexual”. Para a psicóloga e professora Raquel Lemos, importunações sexuais como essas, que resultam em lesões corporais, podem deixar traumas às vítimas, como a ansiedade, humor deprimido, medo e transtornos de ansiedade generalizada .

“No caso desse lamentável acontecimento de hoje com a moça na bicicleta, é só mais um em um milhão de casos que nós mulheres sofremos na sociedade. Inúmeros são os casos de assédios, de importunações em transportes públicos. Muitas das vezes são palavras desnecessárias, ‘elogios’ que acabam ferindo nossa honra. O ocorrido hoje sem sombra de dúvidas trará consequências para aquela jovem. Além dos machucados físicos, os psicológicos”, comentou a especialista.

Culpabilização

A psicóloga destaca que o sentimento da vítima de importunação sexual é de ter o direito de ir e vir arrancado pelo assediador. Segundo ela, a mulher quando sofre esse tipo de assédio se sente impotente e muitas das vezes tenta encontrar uma razão, quando na verdade, não há. “A culpa nunca é da vítima”, lembra Raquel.

“Uma mulher precisa ser respeitada e ter o direito de vestir o que quiser, ir para onde quiser sem medo. São consequências as quais a mesma precisará de uma rede de apoio para conseguir superar esses danos causados por criminosos como esses de hoje. É lamentável pensar que precisamos de uma lei para que sejamos respeitadas”, conclui a psicóloga.

O crime contra Andressa aconteceu em Palmas, na região Sul do Paraná. Nas redes sociais, a estudante compartilhou um vídeo mostrando o momento em que um carro se aproximou dela, enquanto pedalava, e o carona passou a mão no corpo dela. A ação fez a ciclista perder o controle da bicicleta e cair, sofrendo arranhões e hematomas.

Repugnante

Para a advogada Alessandra Ribeiro, a atitude do homem é revoltante e repugnante e certamente deixará traumas psicológicos na jovem. Ela destaca ainda ser lamentável que uma mulher não tenha segurança para andar na rua sem riscos de sofrer esse tipo de violência.

Veja também: Pela 1ª vez, eleições têm recorde de mulheres postulantes e mais candidatos negros do que branco

“É revoltante saber que ainda existe homem desse tipo. Estou aqui escolhendo palavras para me expressar com educação, porque realmente faz a gente perder a compostura. Atitude repugnante, que além de ser um abuso sexual, resultou em alguns machucados físicos. Porém, o pior é o trauma psicológico que certamente ficará”, lamentou Alessandra.

A lógica machista faz com que o corpo da mulher seja um espaço público, no qual pode ser violado e assediado (Agência Brasil/Reprodução)

Violação

A militante do movimento feminista e diretora de Políticas Educacionais da União Nacional dos Estudantes (UNE) Fernanda Fernandes destaca que a população vive uma estrutura social que se consolida no machismo e, dentro dessa lógica, o corpo da mulher passa a ser público, violado e assediado. Segundo ela, o que o mundo vive em uma reprodução dessa cultura e forma de pensar e numa sociedade que consolidou isso.

“A luta dos movimentos sociais hoje, principalmente do feminista, é de repensar essas práticas, o papel da mulher que foi colocado à nós. Nós mulheres podemos ser quem nós quisermos ser, o que quisermos fazer, nós faremos’. A gente tem que estar se reafirmando para ser respeitada nos espaços, para ser ouvida. Esse é um processo que a gente vive no Brasil hoje”, comentou a militante.

Fernanda destaca que o debate sobre essa temática é pertinente, pois a partir desse processo de mudança de pensamento e movimentação de estruturas patriarcais, o movimento feminino terá reais mudanças na sociedade que garantam a vida, a dignidade e a liberdade das mulheres.

“Situações como essas, de uma mulher que é assediada na rua, a gente passa constantemente. E agora observamos um processo de punição desses homens, apesar de ser algo tardio. Precisamos avançar muito nesse debate, mas é importante que a gente dê publicidade a isso, porque significa que a sociedade está começando a se movimentar a partir da fala dessas mulheres. Com elas denunciando, se organizando, a gente consegue movimentar a estrutura e modificar essa lógica do sistema que consolidou o machismo”, salientou.

Preso

Apesar dos envolvidos com o acidente da jovem fugirem, o suspeito de passar a mão na ciclista enquanto ela pedalava foi preso nesta terça-feira, 28. Segundo a polícia, quatro homens estavam no veículo no momento do crime e o caso é investigado como importunação sexual e lesão corporal.

O crime

O Instagram havia excluído o vídeo do perfil da rede social da jovem, que voltou a compartilhá-lo nos stories (Reprodução/Instagram)