Em Brasília, organizações indígenas que atuam no Vale do Javari pedem proteção após morte de indigenista e jornalista

Comissão externa da Câmara definiu plano de trabalho nesta terça-feira, 21 (Marcela Leiros/CENARIUM)

21 de junho de 2022

21:06

Marcela Leiros – Da Agência Amazônia

BRASÍLIA – Representantes do Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (OPI) e da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) pediram proteção a quem atua na defesa dos direitos ambientais e territoriais no Vale do Javari, no Amazonas. Os apelos foram feitos nesta terça-feira, 21, na comissão externa da Câmara dos Deputados que pretende acompanhar as investigações sobre as mortes do servidor licenciado da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do jornalista britânico Dominic Mark Phillips, o “Dom Phillips”.

O indigenista da OPI, Leonardo Lenin Santos, pontuou as principais reivindicações à comissão. Ele ainda lembrou que o desaparecimento e mortes do jornalista britânico e do indigenista “não é uma situação isolada”, já que ameaças e ataques a quem protege os povos indígenas ocorrem há muitos anos e são ignorados pelos órgãos competentes.

“É um modus operandi que está acontecendo na Amazônia em relação aos povos indígenas“, disse ele. “Pedimos que essa comissão, e todas as outras, escutem e respeitem a ação da Univaja, sobretudo, nessa situação. É bom ressaltar que todo o resultado efetivo das buscas, por Bruno e Dom, foi encontrado pelos indígenas, donos daquele espaço“.

Lenin reiterou ainda que é extremamente necessária e urgente a garantia de proteção à equipe de vigilância da organização indígena, sobretudo, aos coordenadores Paulo Marubo, Eliésio Marubo e Beto Marubo, assim como a servidores da coordenação regional da Funai. O Vale do Javari é a segunda maior terra indígena do País, e onde está a maior concentração de povos isolados do mundo.

Essas pessoas foram ameaçadas, apresentaram suas denúncias. Agora, a preocupação é imediata sobre o que acontece com essas pessoas que continuam lá”, pediu ainda.

Outros pontos reivindicados foram: a explicação sobre o andamento do inquérito referente à morte do indigenista Maxciel Pereira dos Santos, em 2019, na cidade de Tabatinga, também no Amazonas; quais os processos abertos pelo Ministério Público Federal (MPF), Polícia Federal (PF), Funai e outros órgãos sobre as denúncias feitas pela União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), além da regulamentação do projeto que instituiu o poder de polícia à fundação.

Abandono

Foi a Univaja, inclusive, quem denunciou o desaparecimento do indigenista e do jornalista ocorrido no último dia 5 de junho. Os corpos de Phillips e Bruno foram encontrados submersos, no Vale do Javari, no dia 15 de junho. Exame médico realizado pelos peritos da Polícia Federal (PF) indicou que a morte do jornalista foi ocasionada por “traumatismo toracoabdominal” provocado por disparo de arma de fogo
usado para caçar. Bruno Pereira morreu em decorrência de “traumatismo toracoabdominal e craniano” ocasionados também por disparos de arma de fogo típica de caça.

O líder indígena, assessor político da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e coordenador da Área de Territórios e Recursos Naturais da Coordenadoria das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica (Coica), Toya Manchineri, enfatizou que o Estado brasileiro abandona os povos indígenas e facilita a invasão na Amazônia.

O que acontece na região do Vale do Javari, em relação aos povos indígenas e seu territórios, é o abandono do Estado brasileiro com relação à proteção dos direitos, na sua totalidade, dede saúde a educação. O que ocorre é que se viola os direitos dos povos indígenas e o governo olha como se eles não existissem no solo brasileiro”, destacou.

O nosso País não consegue proteger a área de fronteira e aí diz que são os gringos que querem tomar a Amazônia, mas nós mesmos não conseguimos proteger o nosso País e nem damos as condições necessárias para que os povos que ali vivem protejam seu espaço e suas casas, mas nos tiram esse direito. O que nos resta é só lamentar e morrer”, finalizou Manchineri .

Plano de trabalho

Além da Câmara dos Deputados, o Senado também instalou comissão externa para acompanhar as investigações do caso e apurar o aumento da violência na Amazônia. A primeira reunião ocorreu na segunda-feira, 20, e segundo o presidente, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), a expectativa é que a comissão vá até o Vale do Javari, no Amazonas, na próxima semana. O presidente da comissão externa na Câmara dos Deputados, José Ricardo (PT-AM), também pretende realizar diligência no mesmo período.

A previsão é que semana que vem já possamos realizar essa diligência. A data ainda vamos ter que definir, mas também teremos um diálogo com a comissão externa do Senado“, disse o deputado federal.

O plano de trabalho da comissão na Câmara dos Deputados vai acompanhar as investigações sobre as mortes de Dom Phillips e Bruno Araújo Pereira, assim como analisar o desmonte dos órgãos de proteção ambiental e indígena na região, e buscar soluções a curto e médio prazo de proteção aos povos indígenas.

A comissão ainda vai realizar audiências com a presença de autoridades, representantes de órgãos públicos, pesquisadores, representantes indígenas e familiares do jornalista e do indigenista assassinados.