ESPECIAL | Uma economia para o amanhã – Tesouro amazônico

Da casca do tucumã, faz-se a compostagem. Da polpa, faz-se sorvete, tapioca e manteiga. Da amêndoa, extrai-se o óleo para cosméticos e fármacos e o caroço se transforma-se em madeira plástica (Ricardo Oliveira/Cenarium)

18 de setembro de 2021

09:09

Bruno Pacheco – Da Cenarium

MANAUS – As riquezas amazônicas são bens preciosos que podem garantir retorno financeiro aos moradores da região e um futuro melhor, se usufruídas de maneira sustentável, protegendo a floresta. Por esta razão, pesquisadores e empreendedores idealizaram projetos inovadores e bioeconômicos para o desenvolvimento de comunidades tradicionais e ribeirinhas.

Um desses projetos é o idealizado pela artesã e designer de joias Rita Brasil Mendonça, de 54 anos, que possui a marca Rita Prossi, com produtos desenvolvidos por ribeirinhos e indígenas.

“Fiz um curso de design de joias, aprendi a desenhar e a reconhecer as pedras, até que uma pessoa chegou e me pediu uma peça para levar para a filha nos Estados Unidos, como forma de matar a saudade do Amazonas”, destacou.

“Ao chegar em Boca Raton, na Flórida, as americanas adoraram o produto [biojoias]”, diz Rita Brasil Mendonça, de 54 anos, designer de joias e proprietária da marca Prossi.

Assim, Rita produziu joias em formato de tartaruga, canoa e arco e flecha. As réplicas em miniaturas foram feitas com a ajuda de indígenas do povo Waimiri-Atroari, por terem a palha de arumã, conhecida pela fibra resistente, material usado por Rita para formar o colar com as joias preciosas.

O material contou ainda com um pouco de ouro, semente de açaí e um anel de tucumã moldado por um indígena Sateré-Mawé e enfeitado por Rita. “Ao chegar em Boca Raton, na Flórida, as americanas adoraram o produto. Conclusão, uma cliente virou uma revendedora minha, na época”, salientou.

As biojoias criadas por Rita Brasil Mendonça com a contribuição de ribeirinhos e indígenas são conhecidas nacionalmente (Ricardo Oliveira/Cenarium)

Atualmente, as joias são feitas pelas mãos de artesãos indígenas e ribeirinhos, que fazem o trabalho inicial de limpeza e corte do tucumã, por exemplo, até os produtos chegarem a Rita, que faz desde o lixamento e polimento do material até a personificação das peças. Uma cadeia produtiva que garante renda para todos os envolvidos.

As peças são conhecidas nacionalmente, uma de suas coleções, chamada de “Pena do Gavião-Real”, foi ofertada ao herdeiro número um da coroa britânica, o príncipe Charles, durante uma visita ao Amazonas, em 2009. A pedido da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), a artesã desenvolveu uma joia para a duquesa da Cornualha, Camila Parker Bowles.

As biojoias também já foram ofertadas ao príncipe de Mônaco, Albert II, que ganhou um peso de papel feito com prata, madeira de pupunheira e semente de tucumã. Além dele, o Papa Bento XVI também foi presenteado com uma cruz confeccionada com palha de arumã e prata. As coleções são usadas, ainda, em desfiles de moda, como o Miss Brasil.

Madeira plástica feita com o caroço de tucumã

O tucumã é um fruto nutritivo muito usado na culinária do Norte do Brasil, cuja casca dura e lisa tem coloração verde, enquanto a polpa é oleosa e de cor amarela ou laranja. A espécie, colhida de uma árvore espinhosa que pode passar dos 20 metros de altura, tem um caroço localizado no centro do fruto.

Pensando nessa possibilidade e para evitar que o caroço seja descartado, o professor doutor Antonio Claudio Kieling, da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), passou a estudar a espécie e entender melhor o potencial do tucumã, desenvolvendo o projeto “Madeira plástica feita com caroço de tucumã”, para a tese de doutorado dele em Biotecnologia na Universidade Federal do Amazonas (Ufam), em 2018.

Durante o processo de pesquisa, foi descoberto que 92% do produto é descartado em Manaus e o volume médio de consumo do tucumã pela população gira em torno de 100 toneladas por mês. Seja como recheio da tapioca, sabor de sorvete ou em outras variedades de alimentos. Desse total, 50 toneladas de caroços são jogadas no lixo. Com essa quantidade, seria possível obter toneladas de pó de madeira.

O conhecimento sobre projeto são repassados aos universitários do professor Antonio Kieling (centro), Leonardo Lima e Yago Moreira (da esq. para direita) – (Ricardo Oliveira/Cenarium)

“Então, você poderia usar a casca [do tucumã] para fazer a compostagem, a polpa para fazer sorvete, tapioca, manteiga e sobra o caroço. A amêndoa, dentro, pode ser prensada e dela extraído um óleo essencial utilizado na indústria de cosméticos e fármacos, enquanto o caroço serve para fazer esse material compósito, adicionando um plástico reciclado, e que serve para fabricar placas, peças e determinados objetos que passam por vários processos de fabricação diferentes”, explicou Kieling.

Processo

O processo de fabricação começa pela quebra do caroço e ocorre por meio da extrusão, quando o material é forçado a sair por um orifício e ganha um formato pré-determinado para a peça. A produção da madeira também pode ser feita por meio de uma injetora ou pela termoformagem, um método de transformação que utiliza o ar quente e a pressão para fazer a moldagem.

“Para se ter ideia, a reciclagem de plástico aqui em Manaus bota fora ao redor de R$ 50 milhões por ano, quando se poderia recuperar metade do material que é jogado através de um processo de coleta organizado, gerando emprego e renda para vender a preço de mercado o material moído”, destaca o professor.