‘Ilha flutuante’: mais de 100 balsas de garimpo ilegal são flagradas em região do Rio Madeira, no AM

Esta é a segunda vez que balsas do garimpo ilegal são vistas na região, em menos de três meses (Divulgação)

30 de setembro de 2022

13:09

Bruno Pacheco – Da Agência Amazônia*

MANAUS – Mais de 100 balsas de garimpo ilegal voltaram a formar uma “ilha flutuante” no Rio Madeira, no interior do Amazonas. Imagens do satélite PLANETº, analisadas pelo Greenpeace Brasil na última segunda-feira, 26, e divulgadas na quarta-feira, 28, flagraram uma nova concentração de balsas na região da comunidade de Fortaleza do Bom Intento, a cerca de 100 quilômetros do município de Manicoré.

Imagens de satélite PLANETº analisadas pelo Greenpeace Brasil na última segunda-feira, 26 (Divulgação)

Esta é a segunda vez que os garimpeiros são vistos na região, em menos de três meses, desde a operação que destruiu centenas de balsas na região, em novembro de 2021. Em julho de 2022, as balsas foram flagradas no Rio Madeira, no município de Autazes (a 111 quilômetros de Manaus). O local é o mesmo em que, no ano passado, a Polícia Federal (PF), com apoio das Forças Nacionais de Segurança, prendeu três pessoas e destruiu 131 balsas utilizadas para o garimpo, durante Operação Uiara.

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A nova movimentação garimpeira flagrada nesta semana, para o Greenpeace Brasil, comprova que a atividade ilegal segue avançando na região amazônica, mesmo a menos de uma semana das eleições no Brasil. A porta-voz de Amazônia do Greenpeace, Danicley de Aguiar, afirma que as imagens das balsas de garimpo escancaram a urgência de adotar uma estratégia de desenvolvimento regional capaz de superar o garimpo e garantir renda para as famílias da região.

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“Mais uma vez, a realidade se impõe e escancara a urgência de que o Estado brasileiro proponha uma estratégia de desenvolvimento regional capaz de superar o garimpo e garantir renda digna para as milhares de famílias que vivem em estado de vulnerabilidade social nas cidades e florestas da Amazônia”, afirmou Danicley de Aguiar.

Invasão de dragas de garimpo no Rio Madeira, no Amazonas, em 2021. As imagens viralizaram no ano passado. (Reprodução/Greenpeace)

“É preciso que sejamos capazes de construir arranjos produtivos que consigam conviver com a floresta e suprir mais do que as necessidades básicas dessas populações. Do contrário, só testemunharemos mais e mais amazônidas se lançando ao garimpo como estratégia de sobrevivência”, continuou o porta-voz.

Sem medo

Garimpeiro procurado pela AGÊNCIA AMAZÔNIA afirma que as balsas voltaram a atuar no Rio Madeira por conta do período eleitoral. Os tripulantes das embarcações de garimpo não acreditam que a Polícia Federal (PF) possa realizar uma operação na região em meio às Eleições de 2022. Além disso, os trabalhadores ilegais destacam que extração do minério não está acontecendo em uma área de reserva.

“A PF só faz operação na região do Rosarinho, porque é uma área indígena e é reserva. Tem área que é reserva, outras não. Aqui, na área do município, não tem reserva, então todos podem trabalhar sem problema, mas se entrar em áreas como a do Rosarinho, que é reserva, a PF faz operação e não tem para onde correr”, afirmou um garimpeiro, que preferiu não se identificar com medo de represálias.

Garimpo ilegal é crime

Ambientalista e mestre em Ecologia, o geógrafo Carlos Durigan, membro da Wildlife Conservation Society (WCS Brasil), explica que o garimpo ilegal se constitui como um crime ambiental e que gera grandes impactos pela degradação e contaminação que causa. Para o especialista, a atividade garimpeira ilegal deveria ser classificada como um crime hediondo.

“O que vemos atualmente na região do Madeira é um aumento expressivo da criminalidade relacionada diretamente à expansão do garimpo ilegal. Esta atividade se constitui crime ambiental que gera grandes impactos ambientais pela degradação e contaminação que causam, além de promover fortes impactos sociais sobre as comunidades indígenas e não indígenas que vivem na região. Por estas razões, o garimpo ilegal deveria ser classificado como crime hediondo”, afirmou Durigan.

Avanço e impactos

Segundo as lideranças indígenas do Amazonas, cada vez mais balsas e dragas de médio e grande porte surgem pelos rios do Estado, impactando as terras tradicionais e os povos que moram nesses territórios. A extração de minérios de leitos dos rios da Amazônia também causa inúmeros danos ao ecossistema, entre eles, a contaminação da água com metais pesados, o aumento da turbidez da água, devido ao contato com produtos químicos, a variação da qualidade da água, dentre outros.

Garimpeiro Gideão Bentes Sales segurando 20 gramas de ouro na Balsa de garimpo no rio Madeira, no município de Autazes, próximo a comunidade Rosarinho, a 120 km de Manaus (Ricardo Oliveira/Agência Amazônia)

Na prática, as embarcações de garimpos ilegais remexem o fundo do rio. O solo é destruído com escavadeiras e jatos de água. A lama criada nesse processo é filtrada para ser recolhidos os minérios como o ouro. Para separar os sedimentos do ouro são adicionados mercúrio, cianeto e arsênio.

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O mercúrio forma um amálgama com o ouro e a lama contaminada com o resíduo é descartada no meio ambiente. Esse mercúrio, em contato com o ecossistema, afeta as águas, a fauna e a flora aquática, além da saúde do homem.

Pedido por socorro

Além do Rio Madeira, o garimpo ilegal tem avançado pelo Médio Rio Negro I e II e seus afluentes, como o Rio Marié, a Noroeste do Amazonas. Na última quarta-feira, 28, lideranças indígenas pediram por providências imediatas das autoridades e órgãos de controle para a retirada de dragas de garimpo ilegal que insistem em permanecer em terras indígenas da região.

O diretor-presidente da Federação Indígena do Alto Rio Negro (Foirn), Marivelton Rodrigues Baré, e o presidente da Associação das Comunidades Indígenas do Baixo Rio Negro (ACIBRN), Gelvani da Costa Baniwa, afirmam que caso nada seja feito, eles mesmos irão tomar atitudes para defender o território.

“A gente pede que os órgãos de controle tenham uma operação séria e de retirada, porque se não tiver atuação, nós mesmos, povos indígenas da região, vamos fazer ação do nosso jeito em defesa do nosso território. A gente pede o socorro e clama por isso”, declarou o líder indígena Marivelton Baré, diretor-presidente da Foirn.

(*) Colaborou a jornalista Ívina Garcia – Da Agência Amazônia