‘Índio, não’: PL quer alterar nome de data que dá visibilidade à luta dos povos indígenas

A deputada federal Joênia Wapichana é a autora da proposta de lei que altera a nomenclatura da data de celebração dos povos indígenas (Reprodução/Câmara dos Deputados)

19 de abril de 2022

17:04

Yusseff Abrahim – Da Revista Cenarium*

BRASÍLIA (DF) – No mês de abril, as comemorações em torno da luta dos povos indígenas ganham protagonismo em todo o País. Embora diversas ações, debates e, principalmente, os protestos ganhem os holofotes, as disputas no campo simbólico também recebem atenção. É o caso do Projeto de Lei (PL) nº 5466/19, que pretende alterar o nome da celebração do “Dia do Índio” para “Dia dos Povos Indígenas”.

A mudança na nomenclatura da data, celebrada no dia 19 de abril, e toda a repercussão que uma alteração desta natureza traz, tem por objetivo dar uma dimensão coletiva à cidadania indígena, que supere a referência étnica individual. 

“É importante frisar que a contribuição é ofertada pela coletividade e não pelo indivíduo isolado, como remete a ideia do termo ‘índio’”. A fala é da deputada federal Joênia Wapichana (Rede-RR), autora da proposta aprovada em dezembro de 2021, pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados e que seguirá para o Senado caso não surjam recursos para a votação no Plenário da Câmara. A declaração foi dada em matéria publicada no site da Câmara dos Deputados, à época da aprovação na CCJ.

Joênia é uma das novas lideranças indígenas em âmbito nacional, que cumpre, desde 2018, o mandato como primeira mulher indígena eleita. Em relação ao projeto, além da representação equivocada da individualidade e isolamento, ela explica que o termo “índio” também remete à estigmatização, quando o ideal é ressaltar inteiramente o valor dos povos originários para a sociedade.

“O propósito é reconhecer o direito desses povos, mantendo e fortalecendo suas identidades, línguas e religiões, assumindo tanto o controle de suas próprias instituições e formas de vida quanto de seu desenvolvimento econômico”, comentou a deputada, à época.

Joênia é uma das novas lideranças indígenas em âmbito nacional, que cumpre, desde 2018, o mandato como primeira mulher indígena eleita (Reprodução/Câmara dos Deputados)

A REVISTA CENARIUM tentou contato com a parlamentar para esta reportagem, mas não obteve sucesso em virtude da agenda de compromissos da deputada.

Autodeterminação sobre termos

Na tarefa da relatoria, onde uma das principais funções é realizar o estudo dos temas submetidos para a elaboração do parecer final, o deputado Wolney Queiroz (PDT-PE) concluiu que os termos “índio” e “tribo” são, historicamente, questionados pelos povos indígenas.

“Tais categorias foram criadas pelos colonizadores como forma de reduzir a pluralidade de cerca de 1 mil etnias indígenas que existiam no País, na época do ‘descobrimento’. Essas e outras reflexões levam a alternativas que fogem do senso comum, que trata cultura tão diversa de forma genérica, reduzindo a diversidade das etnias brasileiras”, ressaltou.

Mesmo pela disputa simbólica, o PL nº 5466/19 é apenas mais um, dentre vários no mandato da deputada Joênia Wapichana. A única legislatura indígena, atualmente, na Câmara.

“O projeto de lei que a gente está propondo no Congresso é no sentido de avançar em termos da consolidação dos direitos indígenas. Quero lembrar que o 19 de abril é o momento de reivindicar, apresentar nossas demandas, visibilizar e, acima de tudo, mostrar a nossa união, a nossa coletividade”, afirmou a parlamentar em matéria publicada no site da Câmara. 

Além da nomenclatura da data de celebração dos povos indígenas, há ainda o Estatuto do Índio, Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973, que permanece com a utilização do termo que remete à estigmatização. O estatuto regula a situação jurídica dos “índios ou silvícolas” e das comunidades indígenas.

Por que 19 de abril?

Caso aprovada, a proposta de alteração do nome da data para “Dia dos Povos Indígenas” revoga o Decreto-Lei nº 5540/43 que instituiu o “Dia do Índio”, assinado pelo então presidente Getúlio Vargas.  

De acordo com publicação no site do Ministério da Educação, o dia 19 de abril foi escolhido para se comemorar a cultura indígena, a partir do Primeiro Congresso Indigenista Interamericano, que ocorreu em 19 de abril de 1940, visando reunir os líderes indígenas das diferentes regiões do continente americano e zelar pelos seus direitos. 

(*) Com informações da Agência Câmara de Notícias.