Literatura periférica: autores de dramaturgia indígena lançam ‘Os Sateré-Mawé e o Teatro dos Clãs’, em Manaus

Indígena da etnia Dessana no Rio Negro no Amazonas (Ricardo Oliveira/ CENARIUM)

03 de junho de 2022

17:06

Marcela Leiros – Da Revista Cenarium

MANAUS – O livro “Os Sateré-Mawé e o Teatro dos Clãs”, uma obra da literatura marginal, ou periférica, será lançado, nesta sexta-feira, 3, a escritores especializados neste tipo de produção literária. Escrita pelo indígena Sateré-Mawé e doutorando em Educação na Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Josias Sateré, pela pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Ambientes Amazônicos (Nepam/Ufam) Jalna Gordiano e pelo professor associado da universidade Renan Albuquerque, o livro aborda, por meio da dramaturgia, os desafios da migração indígena para os centros urbanos.

O evento ocorrerá no Velho Buk Café & Pub, Avenida Pirabas, 132, bairro Alvorada 2, Zona Centro-Oeste de Manaus. À CENARIUM, Josias, da Terra Indígena Andirá-Marau e o primeiro da etnia, no Amazonas, a escrever um livro como peça de teatro na história, falou sobre a história.

Leia também: Doutorando indígena do AM lança primeira dramaturgia escrita por um Sateré-Mawé na história da etnia

Lançamento da obra ocorrerá às 19h desta sexta-feira, 3. (Divulgação)

“Existe algo muito interessante no livro, que é sobre as habilidades de alguém que não conhece o mundo ocidental, não conhece a cidade, mas ele [o personagem] consegue, por meio da percepção da sua cultura, por meio da habilidade que ele tem de sair do problema, fazer a transição entre a aldeia e cidade”, explica Josias.

“Outro fato bastante interessante no livro é que nós vamos ver como o povo da periferia, aquele que não tem científico, mas tem o conhecimento no dia a dia, consegue lidar com a vida, os problemas e as dificuldades. Então eu internalizei esse conhecimento e tentei de uma forma bem didática, bem simples, passar pra outras pessoas que existem diferentes povos, percepções e mentes”, completou.

Josias Sateré é o primeiro indígena do Amazonas a escrever um livro como peça de teatro da história da etnia (Michel Paixão)

Literatura da periferia

Um dos autores do livro, Josias também falou sobre os obstáculos de se produzir literatura em áreas marginais, ou seja, à margem da sociedade. “Fazer literatura na periferia é um desafio, até porque nós não somos acostumados, não temos o hábito da escrita. Sabemos que nas populações indígenas a oralidade é muito forte. Então foi um trabalho inovador, fazer o livro da literatura ainda mais voltado pra dramaturgia. Queremos trazer um conhecimento novo pra quem vai ler”, disse ainda.

À CENARIUM, Renan Albuquerque reforçou a importância de apresentar a obra para além da Academia e do ambiente científico. “Hoje vai ser um diálogo, uma conversa menos acadêmica sobre o livro, justamente para o pessoal da literatura marginal, ou periférica. É um segmento literário que existe em todos os lugares, mas que sempre nos apoia. Uma literatura que é feita a partir das comunidades, da favela, da periferia, que é de onde nós viemos”, disse.

Renan Albuquerque, professor doutor e coautor da obra “Os Sateré-Mawé e o Teatro dos Clãs” (Divulgação)

Teatro e os povos indígenas

Jalna Gordiano completou comentando o impacto que se espera que a obra tenha no atual cenário de ataques aos povos indígenas e a importância que o público da periferia conheça mais dessa literatura.

“Pra mim, principalmente nesse momento que o país está passando, de ataque aos povos indígenas, aos territórios indígenas, acho que é fundamental a gente utilizar as ferramentas que a gente tem pra lutar e defender esses povos”, explicou à reportagem.

“O meu público é periférico, o tipo de literatura que eu faço é literatura de alcance popular, não é elitista. A importância é justamente que as pessoas entendam que a literatura não é uma questão de elite, inatingível, que as pessoas possam, através desse contato, consumir a literatura e que também sirva de incentivo para a criação. Que é algo acessível não só do ponto de vista do consumo, mas também da criação”, finalizou.

Pesquisadora Jalna Gordiano (Acervo pessoal)