Mais de 50% dos garimpos se encontram em regiões sem título de exploração, aponta pesquisa do MapBiomas

Em 2020, mais da metade da área destinada ao garimpo se encontrava em regiões sem título de exploração ou não autorizadas (Reprodução)

09 de agosto de 2022

21:08

Beatriz Araújo – Da Revista Cenarium

MANAUS – Enquanto o presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), defende a prática de garimpagem e sustenta um discurso de que é injusto criminalizar a atividade, no País, um estudo feito pelo MapBiomas apontou a falta de controle, por parte do governo, para a cadeia nacional do ouro e como o garimpo ilegal tem crescido, nos últimos anos, causando problemas ambientais e sociais severos na Amazônia.

Segundo o levantamento do pesquisador Bruno Antônio Manzolli, associado de geoprocessamento do Centro de Inteligência Territorial, que ficou em segundo lugar na categoria Jovem da 4ª Edição do Prêmio MapBiomas, em 2020, mais da metade da área destinada ao garimpo, ou seja, 51%, se encontrava em regiões sem título de exploração ou não autorizadas. Já em 2019, 7,5% da produção nacional de ouro foi atribuída a áreas sem exploração. Quase a metade da expansão, ou seja, 45% de 1.180 hectares do garimpo, entre 2019 e 2020, ocorreu em áreas sem autorização para essa atividade.

Nos últimos dez anos, a prática tem crescido no território brasileiro. Ainda de acordo com o estudo de Manzolli, de 2010 a 2020, o garimpo expandiu sua área em 62,5 mil hectares, enquanto a mineração industrial cresceu, apenas, 1,5 mil hectares. Para entender se essa rápida expansão do garimpo ocorreu em áreas autorizadas ou não, o pesquisador cruzou a classificação do uso da terra, elaborada pelo MapBiomas, com os dados da Agência Nacional de Mineração, em particular, as áreas de garimpo identificadas no interior dos Processos Minerários (PMs) citados na Contribuição Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM).

Os PMs que permitem a exploração de ouro, seja para fins de pesquisa ou exploração comercial, em março de 2020, englobavam uma área de 23,1 milhões de hectares, 3% para lavra garimpeira; 1% para concessão de lavra; 96% para autorização de pesquisa. Porém, se considerarmos apenas os processos minerários citados como origem do ouro, no ato de recolhimento da Contribuição Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), eles somam uma área autorizada de 447 mil hectares, ou seja, apenas 1,9% da autorizada.

Discurso pró-garimpo

Marcado pela informalidade, no Brasil, e falta de fiscalização pelo governo federal, um dos principais problemas do garimpo ilegal é a invasão de áreas protegidas por lei, como Unidades de Conservação ambiental e terras indígenas, além de destruir os cursos d’água e os peixes que sustentam as populações. A atividade libera grandes quantidades de mercúrio na água, que afeta o desenvolvimento dos peixes e a qualidade da alimentação da população.

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Seguindo o ritmo de crescimento da exploração ilegal, no Brasil, os discursos favoráveis à prática também só crescem por parte do presidente Jair Bolsonaro (PL), que ao longo de seu governo concedeu diversas declarações em apoio à flexibilização das regras sobre o garimpo. Em fevereiro, Bolsonaro considerou injustas as criminalizações relacionadas ao garimpo ilegal.

“Não é justo, hoje, querer criminalizar o garimpeiro no Brasil. Não é porque meu pai garimpou por um tempo. Nada a ver. Mas, no Brasil, é muito bacana o pessoal de paletó e gravata dar palpite em tudo que acontece no campo”, disse Bolsonaro, em maio de 2021, durante encontro com eleitores no Palácio da Alvorada.

Neste ano, em apoio direto aos garimpeiros, Bolsonaro lançou o Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala (Pró-Mape), por meio do decreto federal N° 10.966. De acordo com a medida, o programa deve contribuir para o “desenvolvimento da mineração artesanal e em pequena escala, com vistas ao desenvolvimento sustentável regional e nacional”.

Além disso, o decreto também prevê a estimulação “as melhores práticas, a formalização da atividade e a promoção da saúde, da assistência e da dignidade das pessoas envolvidas com a mineração artesanal e em pequena escala”. A medida esclarece, ainda, que a mineração artesanal e em pequena escala diz respeito às atividades de “extração de substâncias minerais garimpáveis”.

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Uma das formas de minerar uma área é a chamada mineração industrial, feita com tecnologia especializada, em um espaço a ser explorado em profundidade. Já o garimpo é a mineração manual sem o auxílio de máquinas. Não é feito em profundidade e, sim, na superfície, degradando áreas maiores dos biomas.

De acordo com a Agência Nacional de Mineração (ANM), as duas situações em que o garimpo é considerado ilegal é quando feito em áreas maiores que 50 hectares ou em terras indígenas.

Aumento de pistas

O número de pistas de pouso clandestinas e clareiras abertas para a aterrissagem de helicópteros usados pelo garimpo, na Terra Indígena Yanomami, em Roraima, aumentou exponencialmente durante o governo de Jair Bolsonaro.

O Ibama mapeou 277 pontos clandestinos de pousos e decolagens espalhados por toda a extensão do Território Yanomami. Em 2019, havia três pistas de pouso e 14 helipontos improvisados ao longo do Rio Mucajaí, um dos principais pontos de garimpo na terra indígena. No fim do ano passado, porém, uma operação da Secretaria de Operações Integradas (Seopi), do Ministério da Justiça, identificou 87 espaços de pouso de aeronaves na mesma região.

Pista de pouso em garimpo ilegal (Reprodução)

O número de pistas clandestinas pode ser maior que o identificado pelo Ibama, como mostra uma ação pela qual o Ministério Público Federal (MPF) pede à 2ª Vara Federal do Estado o aumento da fiscalização e o efetivo combate à presença de garimpeiros na terra indígena. De acordo com o MPF, as operações não foram suficientes para mapear todos os pontos logísticos de suporte aéreo ao garimpo.

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