Mais de 90% do garimpo brasileiro está concentrado na Amazônia, diz MapBiomas

De acordo com a análise, no ano passado, três de cada quatro hectares minerados no Brasil estavam na maior floresta tropical do mundo, sendo que 72,5% do bioma é tomado pela atividade, incluindo a mineração industrial. (REUTERS/Bruno Kelly)

30 de agosto de 2021

14:08


Iury Lima – Da Cenarium

VILHENA (RO) – O garimpo ilegal avançou por 175 mil hectares de todo o território brasileiro nos últimos 36 anos, avançando principalmente sobre Terras Indígenas (TIs) e Unidades de Conservação (UCs), sendo que quase todas as ocorrências – ao todo, 93,7% -, desse crime ambiental foram detectadas na Amazônia, entre os anos de 1985 e 2020.

Os números indicam também que a busca por ouro e outros minérios de forma criminosa dentro do bioma já se tornou superior à área ocupada pela mineração industrial, que se aproxima de 50% do território tomado pela atividade regulamentada no País.

Os dados são do mais novo levantamento da série MapBiomas, divulgado nesta segunda-feira, 30, e que utilizou mais de 100 mil imagens de satélites e uma inteligência artificial para avaliar os impactos da degradação gerada à biodiversidade em quase quatro décadas.

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Canteiro de garimpo ilegal na região do Rio Uraricoera, na Terra Yanomami, em Roraima. (Divulgação/Isa)

Amazônia ameaçada

De acordo com a análise, no ano passado, três de cada quatro hectares minerados no Brasil estavam na maior floresta tropical do mundo, sendo que 72,5% do bioma é tomado pela atividade, incluindo a mineração industrial.

Assim, o território da Amazônia Legal concentra quase a totalidade do garimpo que ocorre em todo País, absorvendo a maior parte da destruição de floresta, da vida que depende dela e dos demais impactos que reverberam sobre a existência e a continuidade de populações tradicionais que se veem na obrigação de proteger seus territórios.

Comparação entre biomas

PosiçãoBiomaÁrea tomada por garimpo (em%)
Amazônia93,7
Cerrado4,7
Mata Atlântica 1
Caatinga0,4

Fonte: MapBiomas

Excluindo a mineração industrial, sobram ainda 101.100 hectares de garimpo em território amazônico, ou seja, 67,6% dos 149.393 hectares ocupados pelo total de área minerada. A floresta corresponde ainda a 49,2% de toda  a mineração que ocorre de forma legal no País. 

Destruição multiplicada

O MapBiomas avalia todo o avanço entre a década de 1980 e 2020, mas destacou que o garimpo cresceu de maneira desenfreada, pelo menos, nos últimos 10 anos, de 2010 até o ano passado.

Enquanto a mineração industrial se manteve em crescimento a um ritmo de 2,2 mil hectares, anualmente em todo o País, por outro lado, o garimpo ilegal saltou de de 1,5 mil hectares por ano para 6,5 mil hectares a partir da última década.

Em 36 anos, a área minerada do País cresceu seis vezes, saltando de 31 mil hectares em 1985 para 206 mil hectares em 2020.

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Garimpeiro ilegal em atuação na reserva Yanomami, em Roraima (Daniel Marenco/Agência O Globo)

Territórios ameaçados

Segundo o estudo, a expansão do garimpo se deu, justamente, por meio de seu avanço sobre Terras Indígenas de Unidades de Conservação, crescimento que também ocorreu nos últimos 10 anos. Para se ter uma ideia, apenas sobre as TIs, o crescimento foi de 495%. Já as UCs, passaram a ter 301% mais incidência de exploração de seus recursos minerais.

Em 2020, de todo o território nacional atingido pelo garimpo, metade se deu nessas áreas de proteção ambiental:

  • 40,7% em TIs; e 
  • 9,3% em UCs.

Entre as dez Unidades de Conservação mais atingidas pela atividade garimpeira, oito estão localizadas no Pará, incluindo as três primeiras do ranking: A Área de Proteção Ambiental (APA) do Tapajós, Floresta Nacional (Flona) do Amaná e o Parque Nacional (Parna) do Rio Novo.

Já as TIs mais exploradas pelo garimpo são dos Estados do Pará, Amazonas e Roraima, o que inclui como vítimas o povo indígena Yanomami, que já esteve em diversos conflitos armados desde o início do ano, contra garimpeiros, no objetivo de expulsar os invasores de suas propriedades. 

TI’s mais atingidos

PosiçãoTerritórioEstadoÁrea atingida (em ha)
Kayapó PA7.602
MundurukuPA1.592
YanomamiAM-RR414 

Fonte MapBiomas

O relatório foi fundamental para evidenciar que 81% do garimpo ocorre como fruto da busca pelo ouro, enquanto que a produção de ferro e alumínio corresponde à metade da mineração industrial. O tecnólogo em gestão ambiental e conselheiro da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, Edjales Benício, avaliar os dados divulgados pelo MapBiomas.

“O impacto do garimpo, seja ele legal ou ilegal, mas principalmente o ilegal, na Amazônia, é extremamente devastador, porque esse empreendimento ocorre justamente nas áreas protegidas, nas Terras Indígenas e nas Unidades de Conservação. O impacto é extremamente danoso para o biodiversidade, aliás, para a sociobiodiversidade”, declarou Benício.

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Mina de garimpo ilegal na Amazônia. (REUTERS/Bruno Kelly)

“O garimpo traz prostituição e alcoolismo, além de ser uma atividade em que poucos ganham e que gera danos irreversíveis, com seu impacto desastroso. Se tratando de TIs e UCs, deveria haver outra forma de desenvolvimento, e penso que Etnodesenvolvimento seria a alternativa mais viável para esses espaços”, continuou Edjales, se referindo a uma série de princípios que visam a geração econômica respeitando a autonomia e a autodeterminação dos povos indígenas. 

Pará no topo

Pará, Minas Gerais e Mato Grosso lideram com as maiores extensões de áreas mineradas: são 110,2 mil ha, 33,4 mil ha e 25,4 mil ha, respectivamente. O Pará também é o que tem a maior parte tomada pelo garimpo: são 76.514 hectares dos mais de 110 mil ocupados pela mineração, seja ela legal ou não.

Em todo o País, o garimpo está presente em 107.800 hectares, enquanto que a mineração industrial ocupa, hoje, 98.300 hectares, somando 206.100 hectares de exploração em busca de minérios. “Vale lembrar que o impacto e o custo são extremamente maiores do que a extração desse metal”, finalizou Edjales Benício.