Senador de RR quer criar comissão para apoiar mineração na Amazônia; ambientalistas criticam: ‘é vergonhoso’

Chico Rodrigues durante sessão no Senado (Divulgação/Senado)

18 de agosto de 2022

21:08

Gabriel Abreu – Da Agência Amazônia

BOA VISTA – O senador Chico Rodrigues (União Brasil-RR) apresentou um projeto de resolução, o PRS 14/2022, que prevê a criação da Frente Parlamentar Ampla de Apoio à Mineração nos Estados Amazônicos. A proposta foi criticada por defensores da Amazônia consultados pela REVISTA CENARIUM nesta quinta-feira, 18, que acreditam que o Senado não aprove o grupo.

O delegado da Polícia Federal Alexandre Saraiva classificou a iniciativa do parlamentar contrária aos interesses do povo brasileiro, aos interesses da população da Amazônia e que mostra um completo desprezo pela preservação ambiental.

“Infelizmente, essa iniciativa do senador Chico Rodrigues dá mais valor ao que existe embaixo da Amazônia, do que tem em cima do solo da Amazônia, que são as florestas, as pessoas e a biodiversidade. É uma iniciativa completamente contrária ao interesse do povo, porque nós já sabemos que não existe uma regulamentação que nos dê segurança quanto à forma como é feita a exploração mineral no Brasil, basta ver o que aconteceu em Brumadinho e o que aconteceu também em Mariana [ambas tragédias ambientais causadas pela mineração]. Então, é completamente lamentável. Acho que a Amazônia tem causas muito mais importantes, muito mais nobres que poderiam ser defendidas por um senador da República”, destacou Saraiva.

Alexandre Saraiva durante participação no programa Roda Viva, na TV Cultura de São Paulo (Reprodução)

Bancada do Crime

Em outras entrevistas, o ex-superintendente da Polícia Federal do Amazonas (PF-AM), o delegado Alexandre Saraiva, fez diversas acusações contra outros senadores de Roraima como: Telmário Mota (Pros) e Mecias de Jesus (Republicanos), ao dizer que eles e outros parlamentares fazem parte da chamada “bancada do crime”. Nesta quinta-feira, 18, o delegado reiterou o que pensa sobre a atuação de parlamentares em defesa do garimpo.

“Eu já disse o que eu penso dessa bancada do crime que existe no Congresso Nacional. Estão no bolso dessa organização criminosa, por isso, defendem o crime. É preciso que a sociedade brasileira repudie com firmeza esse tipo de iniciativa. As eleições estão chegando, é um momento de dentro da ordem democrática a população brasileira dar valor a quem, realmente, tem que dar valor. Hoje, o nosso maior patrimônio é a Floresta Amazônica em pé, não é subsolo. É vergonhoso”, afirmou o delegado.

Preocupante

Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama, afirmou à REVISTA CENARIUM que os parlamentares têm pleno direito a organizar a sua atuação por meio de frentes temáticas. Já que existe, no parlamento, desde sempre, e tem ganhado força nos últimos anos, mas é preocupante já que o objetivo da frente é viabilizar o garimpo sem controle ambiental na Amazônia.

“Isso é muito preocupante, e realmente isso seria um desserviço ao País, uma atuação organizada nesse sentido, com essa perspectiva. Tramita na Câmara dos Deputados o PL191, de autoria do Poder Executivo, que tenta regular a mineração em terras indígenas. Na prática, é um libelo a favor do garimpo, nas áreas, nos territórios dos indígenas. Se esse for o objetivo da Frente Parlamentar, aí realmente, a torcida e a esperança é no sentido de que o Senado não admita a criação dessa frente”, salientou Suely.

Justificativa

Entre os princípios que o texto estabelece para a criação da frente estão: o fomento à exploração responsável; a simplificação de programas de estímulos tributários; o aperfeiçoamento da legislação do setor; e o estímulo à promoção de audiências públicas para discutir a exploração mineral responsável em Áreas de Preservação Ambiental (Apas).

A proposta especifica que essa frente parlamentar abrange uma área composta por 772 municípios distribuídos por nove Estados: Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e Maranhão.

Na justificativa do projeto, Chico Rodrigues argumenta que a mineração é uma das atividades mais importantes da economia brasileira, mas “enfrenta restrições para o seu desenvolvimento, principalmente, na região dos Estados amazônicos. Com isso, uma parte do nosso País é impedida de explorar o seu potencial e de se desenvolver. O mosaico de restrições conservacionistas é uma realidade que vigora na Região Norte, e tem sido um obstáculo até mesmo para pesquisas minerais, em detrimento da economia nacional”.

Trecho da justificativa (Reprodução)

Defensor do garimpo

Chico Rodrigues é um defensor, abertamente declarado, da exploração do garimpo em terras indígenas. Em dezembro de 2021, utilizou a tribuna do Senado para defender a necessidade de regulamentação do uso produtivo das terras indígenas. Segundo o senador, o povo de Roraima está assentado em uma terra bilionária, mas vive sob sérias restrições, muitas vezes passando fome. Para Rodrigues, esse fato é inaceitável. O senador criticou a queima e destruição de embarcações de garimpos, no Rio Madeira, assim como  de aviões, veículos e equipamentos que estavam fora das áreas indígenas de Roraima. 

“Ressalto a necessidade de se regulamentar o uso das riquezas naturais em terras dos irmãos indígenas, que é território brasileiro. E também a situação dos garimpeiros, trabalhadores esquecidos pela União. Nós precisamos desenvolver com racionalidade a aplicação das riquezas nacionais, para melhorar a vida da população brasileira”, afirmou o parlamentar.

Dinheiro na cueca

O senador Chico Rodrigues ficou conhecido depois de ser flagrado pela Polícia Federal (PF), em outubro de 2020, tentando esconder R$ 33 mil na cueca. Durante a Operação Desvid-19, que apurava um possível esquema criminoso de desvio de recursos públicos para o combate à pandemia do coronavírus, em Roraima. À época, o então vice-líder do Governo Jair Bolsonaro negou qualquer irregularidade e alegou que agiu “dominado pelo medo e pelo pânico”.

Rodrigues chegou a ficar 121 dias afastado de suas atividades, retornando somente em fevereiro. Seu filho e suplente no Senado, Pedro Arthur (União-RR) acabou não assumindo a vaga.

Mesmo tendo voltado ao cargo, o senador continua sendo investigado por suposta participação em um esquema de fraude e dispensa indevida de licitações; peculato; e organização criminosa, voltada ao desvio de recursos federais destinados ao combate da pandemia.

Posicionamento

Em nota, o senador Chico Rodrigues informou que a falta de regulamentação, fiscalização racional e presença do Estado brasileiro, nas áreas de mineração, interessa a poucos que se beneficiam de atividades lícitas. Assim, a Frente Parlamentar Ampla de Apoio à Mineração nos Estados Amazônicos tem o intuito de criar um fórum adequado, no Senado Federal, para discutir, de forma apropriada, a questão da mineração do Brasil.

“Também será um fórum adequado para esclarecer, à população brasileira, da importância da mineração para a superação da miséria que aflige o dia a dia da vida dos habitantes da Região Norte e, também, dos interesses pouco republicanos daqueles que se beneficiam da falta de regulamentação no setor mineral.
Essa Frente Parlamentar atuará, ainda, no sentido de se avançar na normatização da atividade de mineração legal e sustentável, em todo o Brasil, criando condições para a preservação da natureza e das comunidades envolvidas, gerando riqueza e prosperidade para a região e para o Brasil”, diz o senador.

Veja a íntegra da proposta: