Tirinha criada por amazonense retrata desigualdade social e ganha repercussão internacional

A tirinha 'O Teatro' faz uma crítica sobre o elitismo social existente na sociedade amazonense (Divulgação/ Instagram)

05 de setembro de 2020

15:09

Luciana Bezerra – Da Revista Cenarium

MANAUS — O ilustrador e roteirista amazonense Ademar Vieira, 39 anos, jamais imaginaria que uma simples tirinha batizada ‘O Teatro’, retratando o elitismo social na cidade de Manaus, causasse tanto frisson e ganhasse repercussão internacional. O desenho postado nas redes sociais do ilustrador, na última segunda-feira, 3, já contabiliza mais de 25 mil curtidas e aproximadamente 780 comentários. 

Segundo Ademar, que ainda está atônito com o sucesso que suas ilustrações estão fazendo nas redes, alguns ambulantes que trabalham em torno do Teatro Amazonas — um dos mais imponentes cartões postais da capital do Amazonas — nunca entraram no local ou quiçá sabem como é espaço por dentro. Além disso, mostrar para o mundo, suas origens, ou seja, de onde ele veio.

Para ver a tirinha na íntegra clique aqui (Divulgação/ Instagram)

“Como havia alcançado um público nacional e internacional, por meio da série de tirinhas sobre a pandemia, lançada em março, achei importante mostrar para as pessoas, minha origem, ou seja, onde eu nasci e moro até hoje. Por isso, ilustrei o Teatro Amazonas como cenário principal da história. E, também, criei o personagem do funcionário do teatro retirando o menino vendedor de bala para representar o elitismo social existente em Manaus e retratar que na realidade, o menino, na visão do funcionário, não pertence aquele lugar”, ressalta Ademar.  

O ilustrador destacou ainda que os funcionários do Teatro comentaram no post da tirinha, no Instagram, por qual motivo ele havia ilustrado eles como ‘estúpidos’.

“Faço uma homenagem à minha cidade natal, Manaus, no Brasil, e ao seu maior símbolo e peço desculpas aos funcionários do Teatro, pois tive que criar um funcionário estúpido para a tirinha, o que não corresponde à realidade. Todos os funcionários são muito educados e gentis. Recomendo a visitação”, explica, na legenda da ilustração publicada no Instagram, o ilustrador e roteirista. 

Criação da tirinha ‘Pandemias’

Em março passado, o ilustrador lançou as tirinhas “Pandemias”, em decorrência dos transtornos sociais, econômicos e de saúde causados pela pandemia de Coronavírus. Uma das postagens, que homenageia as pessoas que precisaram se expor em meio ao pico da pandemia, em Manaus, viralizou nas redes e, tem mais de 100 mil curtidas.

Trajetória

Atualmente, Ademar trabalha na finalização de um game para a gigante de tecnologia Microsoft, que deve ser entregue em outubro. O projeto é uma parceira entre a agência de conteúdo Petit Fabrik, onde trabalha e a Fundação Paulo Feitoza (Divulgação/Arquivo Pessoal)

Ademar, que também é formado em jornalismo pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam), já trabalhava de forma amadora como roteirista. Contudo, percebendo o crescimento do mercado de animação no Brasil, se especializou como roteirista de animação, na Academia Internacional de Cinema, de São Paulo, e voltou a atuar na área, como profissional. Em 2018, ele lançou de forma independente dois quadrinhos sobre a Amazônia, na Bienal de Curitiba, no Paraná. Seus quadrinhos são baseados em sátiras políticas, experiências pessoais ou no assunto que estiver em alta no momento.

Manaus ilustra o primeiro quadrinho do artista (Divulgação/ Arquivo Pessoal)

O ilustrador e roteirista tem como uma de suas inspirações o autor belga Georges Prosper Remi, mais conhecido como Hergé, criador da série animada da década de 80, ‘As Aventuras de Tintim’, cujo personagem epônimo Tintim, um jovem repórter e viajante belga, auxiliado em suas aventuras desde o início por seu fiel cão Milu. O primeiro quadrinho do artista foi uma dicotomia entre a cidade de Manaus e a Amazônia.

“No meu primeiro quadrinho fiz uma dicotomia entre Manaus, que é uma cidade extremamente urbana, que não difere muito das outras capitais do Brasil, porém, ela está no meio da Amazônia, que torna ela especial. O quadrinho fala sobre isso, uma criança que nasce na periferia de Manaus e a única experiência que ela tem com a água é do igarapé poluído. No entanto, ela descobre que é descendente de índios e quer conhecer sobre sua ascendência”, assinala o roteirista.

O quadrinho, segundo Ademar, está à venda na banca de revista do Largo São Sebastião ou em bancas de algumas cidades brasileiras.

Lançamento

O ilustrador deve lançar em novembro um quadrinho de 124 páginas com a saga do índio Ajuricaba, líder da nação indígena dos manaós no início do século 18, que revoltou-se contra os colonizadores portugueses, negando-se a servir como escravo e tornou-se um símbolo de resistência e liberdade.

A iniciativa em parceria com outros artistas amazonense faz parte do edital Conexões Culturais, lançado pela Prefeitura de Manaus, em 2018, onde o grupo venceu a licitação. O roteiro do quadrinho é de Ademar.

“O nosso objetivo após o lançamento do quadrinho pela Prefeitura de Manaus é buscar uma editora em São Paulo para republicar a HQs e distribuir nas livrarias de todo o Brasil”, conclui o ilustrador.