Trans manauara sofre agressão e preconceito no mês mais ‘comemorativo’ do movimento LGBTQIA+
02 de março de 2021
20:03
Priscilla Peixoto – Da Revista Cenarium
MANAUS – “Eu vou sempre me envolver em causa LGBTQIA+, a violência não vai me parar”, afirmou a transexual Juma Manauara, em relato exclusivo à REVISTA CENARIUM nesta terça feira, 2, que foi violentamente agredida na semana passada nas ruas de Campinas, interior de São Paulo.
De acordo com a manauara que mora em São Paulo há pouco mais de um ano, o episódio transfóbico aconteceu após ela e um amigo saírem do expediente de trabalho, para aproveitar um happy hour.
“Paramos em um bar para tomarmos uma cerveja como de costume e quando estávamos voltando para o terminal de Campinas, quatro homens começaram a fazer piadas e nos chamar de viadinhos e gayzinhos. Nos expulsaram e impediram que entrássemos no terminal”, explicou Juma.
Dados da violência
O Brasil é o país que mais mata trans no mundo de acordo com uma pesquisa realizada em pela Associação Nacional de Travesti e Transexuais (Antra) em 2019, apenas no primeiro semestre de 2020, 89 transgêneros foram assassinados no Brasil, o que significou um aumento de 39% se comparado ao mesmo período de 2019.
O ano de 2020 teve o total de 175 travestis e mulheres transexuais assassinadas resultando em um índice de 41% a mais que o ano de 2019, fazendo do ano passado, um ano marcado pelo sangue de vítimas da comunidade trans.
A violência sofrida por Juma, tão próximo ao mês mês de março, que dentre tantas datas importantes, é marcado pelo Dia Nacional do Orgulho Gay e o Dia Internacional da Visibilidade Trans, mostra que apesar de tantas lutas e buscas pela igualdade, acolhimento e respeito, os casos graves de transfobia e homofobia se perpetuam em um país estruturalmente machista e conservador.
Descaso e transfobia
Após ser espancada com uma barra de ferro e ficar desacordada, a trans foi socorrida com fortes sangramentos e conta que, mesmo sendo vítima de agressores homofóbicos, sentiu na pele o descaso de quem presenciou a cena de ataque.
“O mais triste é meu amigo André contar que após o meu desmaio ele ficou em desespero tentando emprestar ao menos um celular de alguém, para chamar a ambulância, pois o meu aparelho foi quebrado com as agressões, e ninguém, absolutamente ninguém se dispôs a ajudar”, lamentou Juma.
“Nem mesmo o Corpo de Bombeiros que ficava próximo ao fato não se prestou a ajudar e muito tempo depois uma moça se compadeceu da situação nos ajudou”, detalhou Manauara.
Trajetória e causas sociais
Juma Manauara é artista e desde pequena já demonstrava talentos para várias vertentes das artes. Nascida em Manaus, partiu em 2019 para Campinas, para viver em busca de acolhimento e dos próprios sonhos.
“Sou artista, sou compositora e cantora, participei de vários concursos e ganhei alguns. Sai de casa em busca dos meus objetivos, em busca de espaço e por não aceitar mais a homofobia que eu sofria por pessoas próximas e pelos meus familiares”, revela Juma.
Ela explica que o nome social, Juma Manauara, foi escolhido por conta de ancestralidade e do contato com a tribo Juma quando criança. Ela afirma que o nome Manauara simboliza o orgulho de sua origem amazônida.
Atualmente Juma trabalha em uma Rede de Apoio a pessoas em situação de vulnerabilidade social, onde cuida especificamente de idosos que tiveram uma história de vida marcada pela violência, ou que passaram pelo manicômio e receberam tratamento de choque.
Envolvimento
O objetivo é reintegrar essas pessoas à sociedade ou ao menos garantir que elas tenham uma passagem de vida digna. Além da arte, ela sempre procura se envolver em causas sociais e temáticas LGBTQIA+ onde alega ser o momento que se descobre enquanto pessoa e enquanto trans em constante desconstrução e reconstrução.
Após registrar boletim de ocorrência e abalada com a violência sofrida, Juma postou nas redes sociais um desabafo comovente, em que afirma que as mortes de pessoas trans viram piadas em um país como o Brasil e questiona.
“Provavelmente não serei a última, estou sozinha? Vou conseguir viver? Seguir em frente? São questionamentos que tenho feito desde que acordei do espancamento”, escreveu Juma.